Editora: Leya Brasil
Ano: 2015
Edição: 1
Páginas: 253
In memorian ao meu pai, Abrahao Mecler

Provavelmente você já conviveu com um psicopata, mas pode não ter se dado conta. Atualmente convivo com psicopatas no trabalho. No passado, já me deparei com psicopatas na escola, na graduação, no mestrado e em tantos outros ambientes de trabalho. É preciso saber como lidar com isso.
Sem muito alarde, já sofri bastante com isso. Pensando que o problema era meu, interiorizei várias questões que na verdade, eram dos outros. Eram os outros. Não me entenda mal, não sou uma pessoa perfeita. Bem longe de ser. Tenho cá minhas psicoses também.
Neste livro, Katia Mecler apresenta de forma bastante simpática uma introdução sem muitos termos técnicos como podemos identificar de maneira clara, a presença da psicopatia nas pessoas ao nosso redor. Ela traz à tona comparações com personagens de livros, filmes e seriados, para que o nosso entendimento seja o mais fácil possível. Também interpreta músicas (como a do Legião Urbana) e abre nossos olhos para as mensagens (que na verdade, não são nada subliminares).
Somos apresentados aos vários tipos de psicopatas (não pense você que psicopata é apenas aquele que mata, como um serial killer). Há três grandes grupos de psicopatias:
Grupo A: esquizóide, esquizotípico e paranóide.
Grupo C: dependente, evitativo e obsessivo-compulsivo.
Ela explica com os exemplos e conseguimos fazer várias comparações com a nossa vida. Entender o princípio do raciocínio de um psicopata pode te ajudar a evitar sofrimentos (ou pelo menos, amenizá-los).
Vale bastante a leitura, principalmente para entendermos o olhar do outro, o que nos leva a uma segunda reflexão: ninguém é perfeito e tampouco a mudança do outro é possível se ele não estiver aberto para isso.
Destaques:
[1] Um bom exemplo é Darth Vader, o vilão intergaláctico de Guerra nas estrelas. Um grupo de psicólogos e psiquiatras da Universidade de Toulouse, na França, detectou no personagem seis dos nove traços do estilo borderline. Para quem não conhece a saga, Anakin Skywalker é um jovem que se prepara para tornar-se um cavaleiro Jedi, ou seja, um guerreiro do bem. Desde cedo, ele demonstra raiva e impulsividade, por vezes, incontroláveis, além de oscilar entre a idolatria e o ódio a seus mentores. Quando adulto, assume a identidade de Darth Vader e se torna a face do mal. Independentemente do lado que escolhe, ele está sempre sofrendo, com um sentimento crônico de vazio. Não consegue estabelecer uma relação com a mulher que ama, não tem amigos – seu jeito instável afasta todo mundo – e, solitário, acaba pondo fim à própria vida. Ideias suicidas, muitas vezes levadas a termo, também fazem parte do conjunto de características das pessoas com o TP borderline. Em nenhum momento, Vader perde o contato com a realidade. Ele tem consciência de seus atos e, com frequência, se martiriza por não conseguir controlar os acessos de raiva. Revela um medo inexplicável de ser abandonado e, por causa desse sentimento, torna-se capaz de maldades incalculáveis. Numa frase, seu mentor, Mestre Yoda, resume bem o que se passa na mente de um indivíduo com essa natureza: “O medo é o caminho para o lado negro. O medo leva à raiva. A raiva leva ao ódio. O ódio leva ao sofrimento.”
[2] O mesmo acontece com outro psicopata famoso da ficção, o serial killer Dexter, do seriado de mesmo nome. Ele trabalha no Departamento de Polícia de Miami e dedica suas horas vagas a matar assassinos que escapam da lei. Um justiceiro sanguinário, cujos crimes – metodicamente planejados – são tão violentos quanto os de suas vítimas. No trato social, Dexter é agradável e encantador com quem o rodeia. De dia, leva uma vida convencional, sendo muito elogiado no trabalho. À noite, caça psicopatas. Em oito temporadas, a série teve uma média de seis milhões de espectadores por episódio, deixando claro o fascínio que esse tipo de história exerce.
[3] Indisponíveis para o outro, os indivíduos com esse traço tendem a ser fechados. Muitos acabam desenvolvendo um afeto exagerado por animais de estimação. Outros transformam o quarto num refúgio. São as características dos eremitas do século XXI, capazes de passar horas enfurnados em um cômodo com computador, videogame e fones de ouvido. A caverna tecnológica preenche quase todas as suas necessidades. No Japão, esse comportamento ganhou um termo próprio: hikikomori. Traduzindo ao pé da letra, seria algo como “puxando para dentro”. Jovens ou adultos abrem mão da vida em sociedade para se refugiar numa espécie de confinamento. “Por que preciso do mundo exterior se posso ficar em paz no meu quarto, sem fazer mal a ninguém?”, indaga uma paciente. Naturalmente, precisamos levar em consideração que algumas culturas valorizam um comportamento mais recluso e introspectivo. No oriente, isso é bem comum. Mas quando a ideia de viver numa caverna – ainda que munida de equipamentos modernos – se espalha pelas redes sociais e atrai jovens criados sob outros padrões, já podemos pensar na faceta esquizoide.
[6] “O esquizoide é o parente ausente. Ele é o irmão faltando nos almoços de família. É o(a) sobrinho(a) que não vai a enterros. Obviamente o resto da família poderá nos tratar da mesma forma. Mas isso não nos é difícil de tolerar. Podemos até ficar chateados por sermos ignorados, mas não nos tornamos emotivos por causa disso”, define a mãe de um jovem diagnosticado com esse traço. O indivíduo com esse estilo de personalidade parece ter feito um botox emocional, tamanha a falta de expressão de seus sentimentos. Sua expressão facial pode parecer paralisada, independentemente do que acontece no mundo ao redor.
[7] É possível observar pistas do transtorno de personalidade borderline na adolescência, embora o diagnóstico só possa ser firmado no início da vida adulta. O livro O apanhador no campo de centeio, de J. D. Salinger, um clássico da literatura americana, pode ser interpretado como a história de um border em formação. Holden Caulfield, de 17 anos, age de forma frenética para evitar um abandono real ou imaginado; tem como padrão relacionamentos instáveis e intensos, oscilando entre a idealização e a desvalorização; é impulsivo nos gastos e no uso de drogas e, frequentemente, ao longo da narrativa, admite sentir um vazio inexplicável. O rapaz vive se envolvendo em brigas, motivadas por acessos de raiva. Eis aí outro traço dos indivíduos borderline: como lidam mal com a palavra “não”, podem reagir com violência quando contrariados. Uma simples discussão no trânsito chega rapidamente às vias de fato. Assim como o jovem Holden Caulfield, o indivíduo com esse transtorno tenta, a todo custo, preencher o vazio existencial que o incomoda, seja em família ou nos relacionamentos amorosos. Pula de galho em galho, à procura de algo que sequer consegue explicar direito o que é.
[8] No ambiente de trabalho, por exemplo, quando ocupam cargos de chefia, fazem a linha “morde e assopra”, alternando elogios rasgados com críticas devastadoras. “Às vezes, meu chefe parece fugir do controle, fica irado, colérico, por nada. De repente, tudo fica bem. Sinto como se estivesse caminhando em areia movediça”, conta o funcionário de uma multinacional.
[9] Indivíduos do grupo A (esquizoide, esquizotípico e paranoide) podem manifestar surtos psicóticos. Já os do grupo B (antissocial, borderline, histriônico e narcisista) e os do grupo C (dependente, evitativo e obsessivo-compulsivo) tendem a ter quadros de ansiedade e depressão.