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Para a Clara e sua turma

“O Fazedor de Velhos” é, coincidentemente, mais um livro que trata a questão da busca profissional como mote de libertação e dúvida existencial. Talvez seja a tímida redenção que eu tanto busco venha dos livros que leio.
Narrado em primeira pessoa por Pedro, acompanhamos sua infância, juventude e vida adulta. Ele conhece, nestes (des)encontros do destino, Nabuco, um velho e misterioso professor que entra em sua vida para ajudá-lo na orientação da dúvida que permeia sua existência: continuar a graduação em História.
De forma previsível, Pedro se apaixona por Mayumi, afilhada de Nabuco que aparece na metade da trama e os dois começam um romance “impossível”. Impossível, porque ela precisa retornar para a França por motivos acadêmicos. É curioso como o ocidental tem esta premissa de que precisa estar junto fisicamente, para estar junto. Se for um sentimento de verdade, ele vai aguentar o tempo e a distância que for. Caso não dure, não era verdadeiro. E mesmo que não dure o tempo que esperamos, quem pode provar que não foi verdadeiro enquanto durou?
Leitura rápida (li no voo de ida Rio de Janeiro x Chile). Gostei do estilo de narrativa do Rodrigo, principalmente pelas referências literárias que ele insere na sua prosa (mesmo achando que ele exagerou nas passagens dos livros que ele cita – a tala da intertextualidade. No entanto, cabe dizer que achei um pouco entediante, principalmente a parte de Shakespeare – não me levem a mal, nunca li e penso que não gostarei de ler – mas o mais perto de Shakespeare que já cheguei, infelizmente, foi Chapolin).
Destaques:
[2] – Vocês vão se perder de vista, sim. E o tempo para ver os ex-colegas de colégio não vai existir. Os papéis com os telefones que vocês acabam de anotar vão sumir como que por encanto. Crescer é, de certa forma, se separar das pessoas amadas.
[3] – Alguns momentos, algumas coisas, ou pessoas, cheiros, visões, objetos e lembranças, nos põem em contato com o passar do tempo. Tudo o que nos emociona, tudo o que nos toca fundo, é o tempo chegando e indo embora. Se eu pudesse dar um conselho a vocês, eu diria: não queiram nunca ser eternamente jovens; gostar de viver é gostar de sentir, e gostar de sentir é, necessariamente, gostar de envelhecer.
[4] E o discurso indigesto recomeçou: – Falem com o tempo. Conversem com ele. Fiquem íntimos dele. O tempo é a nossa única companhia garantida até o último instante.
[5] – Sejam orgulhosos na derrota, e bondosos na vitória. Muito obrigado.
[6] Foi quando eu falei com todas as letras que estava apaixonado. Minha vontade, naquele momento, era ser cantor de ópera e mandar ver numa daquelas árias de romantismo arrebatado – mas deixei por menos. A Mayumi me olhou nos olhos e disse: – O que eu posso te dar, Pedro, não é o que você quer. Hoje, o que você quer é impossível. – Por que impossível? – Eu vou embora daqui a pouco… – Eu espero. – É muito romântico dizer isso, Pedro. Combina com você. Mas não comigo. – Porque você luta contra. – Meus pais morreram. Minha avó morreu. Agora só falta meu padrinho, já chega. Eu não preciso me ligar a mais ninguém, para depois perder essa pessoa de novo. – Mas quem disse que você vai me perder? – Você vai ficar esperando até eu voltar da França? Daqui a mais de um ano? – E por que não? Ela suspirou. Antes que eu dissesse qualquer coisa, decretou: – Eu prefiro um amor um pouco menos pesado. – Você não acredita ou não quer, para não sofrer mais? – As duas coisas. Tenho minha profissão, minhas pesquisas, assim como você tem a sua. Não basta? Naquele momento, a Mayumi não era menina, ou moça, era uma mulher completa. Eu, portanto, estava em desvantagem. Diante disso, apelei: – Você quer envelhecer sozinha? – Não sozinha. Mas também não envolvida num tipo de amor que exige de mim um sentimento de entrega que não quero mais ter. Fiquei perplexo com aquela opção de vida. Para mim, já que todos nós temos alguma dependência, que pelo menos seja a dependência dos sentimentos amorosos. O que exatamente ela estava querendo me dizer com “menos pesado”, “não posso te dar o que você quer”, “não sozinha, mas não me entregando”?
[7] É claro que a profissão de escritor é um pouco mais estranha que as outras. Em geral, não dá dinheiro, mesmo que dê alguma fama. Além disso, é uma atividade bastante solitária, que exige muita disciplina. Todo escritor é um pouco obsessivo. Você chega a saber de cor parágrafos inteiros do livro que está escrevendo, de tanto ler e reler, e trocar vírgulas de lugar, e substituir palavras que aos olhos dos outros não fazem nenhuma diferença. Mas eu gostava até desse pacote meio neurótico de frustrações e impulsos idealistas. De todas as características da profissão, porém, a que mais me realizava era a atenção caótica que ela pressupõe. Por um lado, a literatura é uma atividade superexigente e ciumenta, que nunca te deixa mergulhar de cabeça em nada mais. Por outro, ela te obriga a se interessar por mil outras coisas.